domingo, 7 de abril de 2013

A Nova Roupa do Rei

Conversam T, P, S e C, no botequinho da esquina, assistindo pela TV à cerimônia de abertura.
T: “Ele está nu.”
P: “Precisamos falar pra ele! É o Rei.”
S: “Mas, disseram que somente os inteligentes enxergam a roupa!”
T: “De forma alguma. Ele está nu! Não posso concordar com essa gente ‘inteligente’ que vê o Rei pelado e diz que ele está vestindo trajes maravilhosos!”
S: “Vais duvidar do Rei?”
C: “Como podes duvidar do Rei? Ele mesmo disse ser de ótimo gosto sua vestimenta!”
S: “Não duvides do Rei! Dirão que és um tolo, meu amigo!”
P: “Meu silêncio em nada ajudará. Mas, tudo bem. Nada direi.”

E as festividades começaram. Todos festejaram bastante. Tendo como a mais ilustre figura o Rei, nu.
No mesmo botequinho, juntamente com F e G, os amigos assistiam a um dos eventos da Festa.
P: “Vá lá… Como pode? Precisa que alguém diga ao Rei que ele está nu. Por favor.”
S: “Não… Estás louco? Os demais cidadãos rirão daquele que isto fizer. Rirão da ignorância! O Rei está vestindo um belo traje! Até já consigo vê-lo!”
G: “Antes não via, obviamente! (gargalhada) És um brincalhão, S!”
F: “Ora… Também começo a perceber a beleza de tal fazenda utilizada! Que cores! Maravilhosa costura! Que artistas fantásticos os tecelões!”
C: “Sim! Artistas admiráveis! Vejam! E olhe que festa linda!”
S: “Uma pena não podermos participar…”
F: “Onde isso? Não poder participar? Fizemos a festa! Foi na marcenaria do G que os móveis foram fabricados! Gratuitamente, óbvio…”
C: “Em favor do povo!”
F: “Mas, foi lá! Não é mesmo, G?”
G: “Claro! Vejam meus calos! Passei dias e dias na oficina! Foi um trabalho voluntário! Orgulho-me demais disso!”
S: “Está certo, G! E veja! Em suas belíssimas cadeiras estão sentadas pessoas dos mais variados reinos! Estão admirados com nossas mulheres e suas danças exóticas!”

F: “Só não entendo como podem rir tanto da vestimenta do Rei. Será que não têm bom gosto?”
T: “Acho que eles sabem que o Rei está nu.”
C: “Calado! São ignorantes, isso sim. Nosso Rei é o mais importante deste continente!”
P: “Bem que poderíamos estar junto aos convidados, curtindo a festa. Mas, já que não temos o suficiente para as entradas, assim como a grande maioria da população de nosso reino, por que não deixamos pra lá e continuamos a apreciar pela televisão tão magnífico evento?”
C: “É o melhor a ser feito!”
F: “Viu quem vai comentar sobre os acontecimentos da festa? Aquele fantástico ícone da moral e dos bons costumes de nossa nação!”
C: “Adoro ele!”
G: “Comecei a gostar mais ainda depois que mostrou pela televisão sua luta contra a obesidade. Que herói!”
S: “Quietos! Está entrando no salão o nosso palhacinho malabarista!”
C: “Olhem! Hoje está com um novo penteado! Vou amanhã mesmo, ao cabeleireiro, levar o meu filho!”
G: “Viu que ele namora aquela atriz linda?”
F: “Ela ficou muito mais linda depois que começou a namorar com ele…”
S: “Vejam! Aquele homem malvado deu um fortíssimo encostão no nosso malabarista! Que absurdo!”
P: “Se bem que nosso malabarista não está tão criativo assim…”
C: “Cale-se! O fantástico ícone está muito entusiasmado com ele! Comenta com toda honestidade possível sobre a perfeita atuação do jovem de cabelo bacana.”
G: “Entretanto, os dois são parceiros comerciais… Não sei, não.”

F: “Ali vai o Rei!”
C: “Viva!!!”
S: “Vivas ao Grande Rei!”
Os demais presentes no botequinho esboçaram sorrisos. Alguns soltaram seus doentes ‘Vivas!’. Muitas das vozes estavam cansadas. Entretanto, naquele reino, o pão, não importando seu estado, já que muitas vezes surgia nos pratos mofado, sempre era distribuído generosamente.
P: “O Rei!”
T: “Ainda pelado… que vergonha.”
S: “Vejam! Os convidados estrangeiros estão rindo muito do Rei!”
C: “Eles são tolos demais! Como podem não enxergar a linda roupa de nosso tão magnífico Rei?”
T: “Talvez porque o Rei não esteja vestindo coisa alguma…”
G: “Mas, ele disse que estava!”
P: “Os institutos de pesquisa mais importantes do reino já publicaram por diversas vezes números e números comprovando a popularidade e a aprovação ao governo de nosso Rei!”
F: “Lembro-me que este mesmo Rei também disse que a festa seria para todos nós…”
S: “Claro… O ‘nós’ que é ‘eles’. Estamos no Reino de Todos.”
P: “Sim. É o Reino de Todos. Todos mandam em nóis.”
C: “É nóis!”
Há de se pensar e de se pedir quem lê: “Vês e sabes, já que é verdade sua parte, que o Rei está pelado, T… Faça alguma coisa!”?
_ Texto inspirado na Obra de Hans Christian Andersen (Odense, 2 de Abril de 1805 — Copenhague, 4 de Agosto de 1875) –, A Nova Roupa do Rei

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