segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Pororoca: um passeio nos braços de Deus

   Naquela manhã, o tempo não estava como da outra vez. Havia nuvens no céu. Não conseguia identificar o vento. Não era nordeste e também não era vento sul. Parecia sudoeste, sei lá. Eram 5h da manhã e os meninos já estavam acordados. Para os que ainda dormiam, bastou uma pequena aproximação para se ouvir:
   - Está na hora, tio?
   Em pouco tempo, eu, meu filho, meu cunhado, nossos sobrinhos e ainda o namorado da nossa sobrinha estávamos preparados. Material de pesca, refrigerantes, sanduíches e tudo o mais prontos. Não demorou muito e já se ouvia dizer entre eles:
  - Por que não vamos logo embora?
  Partimos. Já próximos ao porto, avistamos o nosso barco. O pescador dizia:
  - Temos que sair logo..., vocês se atrasaram desta vez!
   Em um instante, tudo estava arrumado! Perguntei ao pescador como deveria estar o mar naquele dia e se iríamos conseguir pegar muitos peixes como da outra vez. Enquanto ele falava, recordei por alguns instantes a última pescaria... O céu não tinha uma nuvem..., o mar parecia uma piscina..., os peixes pareciam que não se alimentavam há dias.... Chegamos a pular no mar para brincar!... No mar, não! Em alto mar! A muitos quilômetros da costa! ... Inesquecível!!!
   Ele ainda falava, quando percebi que dizia que o mar estava um pouco mais agitado, e que seria mais difícil entrar.
   Zarpamos. Quando chegamos perto da foz, logo percebemos que havia muitas ondas no mar e que elas entravam no rio. Eram pororocas!!
   O pescador parou o barco, amarrou as caixas que havia sobre o convés, disse para que todos ficassem na parte de trás do barco e que se segurassem no mastro. Pediu para que os menores ficassem perto de nós e falou que devido à pororoca ele teria mais trabalho para entrar no mar.
   Olhei para o meu cunhado. Ele me disse baixinho:
   - Ele já pesca há muitos anos, tem experiência!
   Confiamos. O pescador afirmou:
   - Precisamos entrar no mar no momento certo, colocar o barco entre duas ondas e sair para o lado. Dando tudo certo, só deveremos passar por uma onda. O barco deve estar de frente para a onda, assim ela passará por cima de nós e logo depois estaremos no mar.
   Além de ter acontecido tudo o que ele havia nos dito, uma outra onda nos pegou um pouco de lado, bem no final, como lembrou meu filho, quando recordávamos o passeio. Que bom!!
   Estávamos todos molhados! Uma boa parte da onda havia passado por cima de nós. Todo o material que havia sido amarrado estava lá. As crianças estavam felizes por tanta emoção! Nossos corações batiam como nunca! Estávamos indo para outra pescaria em alto mar!!!
   É então que eu te pergunto, meu irmão:
   Quantas vezes você já confiou a sua vida a um pescador? A um motorista que conduzia à noite o ônibus onde você dormia? A pessoas que conduziam os outros carros que vinham na mão contrária em ruas e estradas?
   Quantas vezes você passou por um risco ainda maior que este, hein?
   Mas Deus não cuidou de você? Deus não está sempre cuidando de nós todos?
   Quantas vezes estamos diante de problemas, desafios onde temos que decidir se continuamos ou não?       Temos medo! Há riscos! Há uma pororoca ... Precisamos confiar em alguém!
   Coloque a sua vida nas mãos de Deus! Confie Nele! Se abandone nos braços d’Ele!
   Reze, medite, peça a Deus que lhe mostre o melhor caminho. Ele sempre cuidou de você. Ele não vai abandoná-lo agora.
   Depois da pororoca, existe sim um mar muito lindo! 


João e Marta
Fraternidade Pequena Via - Campos/RJ
15 de outubro de 2005
Amigos queridos!

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Deus gosta de arte!




Atribuído ao rei Davi, no Antigo Testamento da Bíblia Sagrada, encontramos belíssimos salmos compostos para enaltecer, reconhecer e suplicar ao Senhor Deus inventor de todas as coisas. Dentre estes versos bonitos, destaco o salmo 138, com suas palavras inquietantes ao pensarmos em Deus como aquele que nos teceu e tece de maneira tão admirável no útero materno: “Senhor, vós me percrustais e me conheceis. Sabeis tudo de mim, quando me sento ou me levanto.” Sal 138, 1.
            Quão belas e admiráveis são as obras do Senhor, deleite para alma e por isso mesmo, dignas de contemplação e respeito. É bem isto, para nós que acreditamos que as mãos que nos fizeram foram as mãos do divino Autor, podemos também colocar a lente de santa Teresinha, ou seja, somos nós o jardim do Senhor e nele está contida flores de todos os tipos,  lá ou aqui estamos eu e você!
            Flores, pinturas, artesanatos, melodias, poemas, salmos etc. Infinidade de conceitos que são designados como arte e a matéria prima para fazê-las muitas vezes são atribuídas às  mãos do grande Autor, já diria Teresinha: “somos o jardim do Criador”. Deus é um artista e como tal, a gente não precisa se enganar: Ele gosta de arte!!!
            “Fostes vós que plasmastes as entranhas de meu corpo, vós me tecestes no seio de minha mãe” Sal 138, 13. Não há palavras que expressem quão artista é Deus, o quanto ele gosta de arte e de acordo com a fé professada, não há dúvida de que ele também quer que sejamos seus imitadores, ou seja, aqueles que também são criadores, herdamos tal capacidade e a teologia nos ensina que somos com Deus co-criadores.
            Infelizmente vemos um mundo que utiliza tal capacidade para a destruição, em muitos casos não se colore mais o mundo, assim como não se assiste cotidianamente na mídia o colorido que as pessoas desenham umas nas outras, ao contrário, o cheiro de pólvora, álcool, queimadas, além dos hematomas pelos corpos e porque não dizer dos hematomas nas almas... é assim que nós seres humanos, co-criadores temos feito com o dom mais profundo e de beleza inigualável recebido pelo grande Autor que, por sua vez,  nos criou para sermos junto com ele autores da vida na sua mais variada forma de existência.
            Muitas vezes somos como aquelas crianças birrentas que além da falta de desejo e empenho para criar e recriar seus próprios brinquedos, ainda quebram àqueles que tão facilmente foram comprados pela comodidade de termos tudo tão mais acessível em nossas nas mãos.
            Coração que se esqueceu de olhar um pouco mais para o céu e assim como Davi, o rei, salmodiar: “Sede bendito por me haverdes feito de modo tão maravilhoso. Pelas vossas mãos tão extraordinárias, conheceis até o fundo a minha alma” Sal 138, 14. 
Não há dúvida de que o ser humano é capaz de belas criações e soluções, quantas não são as Instituições, religiosas ou não, que estão por aí construindo a paz, realizações concretas da mão humana que entende a arte também como a ação na própria vida, em obras.
Bons artistas são aqueles que não escondem o que há de melhor no coração e muitas vezes esse melhor sai após a vivência de uma dor profunda, a dor é também um meio eficaz para a criação.
Benditos são aqueles que se entenderam artistas, todos somos e não precisamos duvidar, pois se Deus é artista, nos fez para viver como tal, artesãos a pleno vapor, precisamos lançar mão das nossas ferramentas para começar ou continuar a trabalhar, e se juntarmos nossas ferramentas, quão belo e perfumado não ficará o ambiente a nossa volta, nesse imenso jardim que é o mundo?!
Mãos à obra meu artista, há uma pincelada nesse mundo que só você pode dar, não deixe que outros façam por você, o dom é seu, vamos juntos, o caminho se faz caminhando!

Flaviane Ferreira
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Soneto de fidelidade

Vinicius de Moraes

 

De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento
Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento
E assim quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama
Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Debaixo da tua figueira

No Evangelho de São João há a descrição de forma muito interessante do encontro de Jesus com os primeiros discípulos, o que pareceu bastante ocasional, pois Jesus estava passando (João 1, 36).
É possível entender que tudo o que para nós é simplesmente ocasional, para Deus não, há um proveito e uma intenção em todos os momentos de nossas vidas, foi assim com os discípulos pelo que conhecemos da Escritura e acreditamos que acontece da mesma forma até os dias de hoje.
Jesus passava e ia convidando àqueles que ele queria como explica a Palavra. No Evangelho de São João há um diálogo profundo entre Jesus e Natanael que esclarece isso, pois, apesar de Filipe testemunhar que havia encontrado àquele que Moisés havia dito na lei, o messias, filho de José de Nazaré; Natanael não se sentiu empolgado e mais ainda, duvidou de que da cidade de Nazaré pudesse sair coisa boa (Jo 1, 46).
Ao ver Natanael, Jesus mostra a ele primeiramente que conhecia o seu caráter ao chama-lo de verdadeiro israelita, no qual não há falsidade (Jo, 1,47), ele por sua vez questiona Jesus com certo estranhamento: “Donde me conheces?” e Jesus responde o que Natanael não esperava e nós também por muitas vezes não esperamos ou esquecemos: “Antes que Felipe te chamasse, eu te vi quando estavas debaixo da figueira.” (Jo, 1, 48).
Lendo um pequeno texto sobre esta passagem, o autor explica que estar embaixo daquela figueira poderia representar as coisas pessoais que Natanael estava vivenciando que somente ele e Deus sabiam – e continua – a figueira que parecia ser um lugar de solidão apenas de Natanael, era também lugar de Deus que o havia visto a pensar na vida e nas decisões que precisava tomar.
O que podemos pensar sobre tamanha sabedoria de Jesus está relacionado ao quanto Ele também confia em nós, por isso chamou Natanael que nem acreditava que dele pudesse vir algo de bom; e continua chamando até os dias de hoje, Deus confia em nós, por isso nos vê sentados embaixo da nossa figueira e assim mesmo, nos convida, ele diz: “Vem e segue-me”.
A fala de Jesus muito impressionou Natanael que logo mudou o discurso reconhecendo: “Rabi, tu és o filho de Deus, tu és o Rei de Israel” e Jesus responde: “Verás coisas maiores do que essas…” (Jo, 1,49).
As vezes não escutamos a voz do mestre e ficamos sentados tentando resolver todas as coisas, como se Ele não soubesse de todas elas, não pudesse nos auxiliar ou ensinar o melhor caminho e dessa forma, nos sentimos tão aprisionados que nos é impossível ver coisas maiores como bem disse Jesus, a gente não acredita que ele também confia em nós.
Deus nos conhece perfeitamente, sabe que pecamos, erramos, mas a todo o momento ele não deixa de confiar em nós, de dizer que nos vê e sabe que tipo de homem e mulher somos, é assim mesmo, não de outro jeito ou do jeito como gostaríamos. Ele vê e nos diz hoje, mesmo que só acreditemos porque lemos agora que ele também nos vê como viu Natanael e tantos outros, devemos crer que poderemos ver coisas maiores, basta reconhece-lo, nos apresentarmos e segui-lo pelo caminho.
Esse diálogo profundo entre Jesus e Natanael mostra a presença de alguém que o conhecia quando estava isolado, pensativo debaixo de sua figueira. Pela fé que temos podemos pensar que Jesus também dialoga conosco o tempo todo, dizendo para que possamos confiar nele e não esquecer que Ele também confia em nós, pois nos vê sempre debaixo da nossa figueira e que se nós crermos veremos coisas ainda maiores.
Repito: “Ele nos vê, ele confia em nós!”

Flaviane Ferreira

sábado, 3 de setembro de 2011

Rabisco ou desenho?


Recentemente lembrei-me de uma explicação que dei às professoras da Educação Infantil lá na escola: falamos sobre o colorido e o rabisco... Expliquei a importância de sempre direcionarmos as crianças para que façam o colorido apenas em uma posição. Ou seja, se elas começarem a colorir com o lápis em pé, devem continuar até o fim na mesma posição. Do mesmo modo, se começarem a colorir com o lápis ou giz de cera deitado, devem conservar essa posição até o fim e as professoras precisam incentivar até que terminem o desenho.
 Isso significa que as crianças começam a organizar seu pensamento e seu espaço muito mais no seu interior que no exterior. Elas vão aprendendo que precisam organizar suas idéias, até mesmo para fazer um simples desenho. Os pensamentos mais abstratos partem desses pequenos aprendizados.
Conto isso para dizer que o mesmo acontece conosco em outro sentido: ou damos continuidade ao colorido de nossa vida, ou rabiscamos hora aqui, hora ali e, ao final, como disseram meus meninos: "tá bonito não, tá tudo rabiscado..." Profundo isso!
Não é raro observar que aqueles que têm certa dificuldade, sobretudo emocional, no momento em que fazem seu desenho costumam rabiscar por cima do mesmo, tampando todo o trabalho, não sobrando nada, a não ser um emaranhado de cores. Isso nos permite perceber o coraçãozinho da criança, se está sofrido ou sufocado.
Não duvidemos, há muitas crianças se perdendo num emaranhado de cores e rabiscos, além das que nem expressão colocam no papel, ou riscam traços leves que nem dá para identificar o que quiseram ou se quiseram mostrar alguma coisa. Tais situações precisam ser avaliadas com cuidado e zelo por todos nós adultos.
Agora pensemos: será que esta situação se restringe ao mundo dos pequenos? Será que a gente também não rabisca pela vida afora? Será que não estamos rabiscando quando trabalhamos, quando cuidamos dos nossos afazeres ou das pessoas queridas que convivem conosco? Temos desenhado ou rabiscado?
Não conheço as respostas, estou a caminho, mas é necessário que, hoje e todos os dias em que estivermos pintando por essa terra, sejamos capazes de, como adultos já mais organizados interiormente, escolher melhor as cores, o movimento que fazemos e, principalmente, dar continuidade ao que começamos. Nossa vida precisa ser contínua porque não fomos feito de rabiscos. Ao contrário, Deus é preciso em sua criação! O texto de Gênesis 1 descreve o ato criador, simbologia bonita que traduz quão magnífico artista é o grande Autor. Também está escrito no Salmo 138,13b: "vós me tecestes no seio de minha mãe". Gênesis 2,7 diz ainda que fomos formados do barro da terra e Deus inspirou-nos nas narinas um sopro de vida. Lembrei-me que fazemos muitos objetos com as crianças a partir da argila.
O desafio está lançado, sempre é hora de desenhar. Se a gente só escreve, a vida fica muito séria e formal. As cores estão aí: são os bons sentimentos que carregamos, nossos dons, nossas mãos e pés para colorir esse mundo de meu Deus. O barro de que fomos feito é do mais puro. Unidos ao Criador, somos co-criadores, ou seja, criamos por causa dele. Isso nos impulsiona a fazer arte. Sejamos artistas, mas o nosso palco é a vida concreta. Na TV tudo acaba rápido. Na vida a gente deixa marcas por onde passa, marcas do eterno!


 



Flaviane Ferreira